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Nem sempre cliente convertido é cliente satisfeito

Nesse artigo falo sobre comunicação, mecânicas de oferta, transparência, respeito, uso de dados, boa definição de KPIs bem como leitura do que vem a ser "sucesso". E, claro, sobre como se estreitar - ou destruir - a relação do cliente com sua marca.


Faz poucos dias eu estava acompanhando a minha família no caixa de uma dessas mega lojas de roupas de shopping center. E como não poderia deixar de ser, sempre atento ao que acontecia ao redor.


Percebi que a caixa ao lado estava tentando convencer a cliente de alguma coisa. Pronto, ganhou minha atenção.


A balconista estava comunicando à cliente que ela tinha 10% de desconto aprovados àquela compra, se pago via PIX. E completou: "não precisa fazer nada, é só aceitar". A cliente ficou surpresa. Desconto sem esforço? Quem não quer?


E a atendente completou: "e, uma vez que você aceite, você poderá escolher o dia do mês no qual quer pagar e te enviaremos uma mensagem com o PIX e o QR code para pagar no dia escolhido".


"Ah não! Muito estranho!", pensei. A cliente também desconfiou com sua mudança de expressão facial e corporal. Como assim, desconto sem pedir nada em troca, para pagar quando quiser? Mas a cliente estava claramente balançada por poder receber R$ 70 de desconto numa compra de R$ 700.


A atendente, aparentemente muito bem treinada - e muito desenvolta -, disse que não precisaria de nenhuma informação uma vez que tinham o nome, o telefone e o CPF da cliente.


A cliente estava receosa. E questionou mais. Para entender a mecânica, provocou o que a loja faria caso ela não pagasse no dia combinado dado que não teria havido uma transação ali, no ato da compra em loja.


Eis que minha filha, que estava ali esperando comigo, me chamou para ver algo ao lado do caixa. Fiquei triste por saber que perderia aquela excitante história que estava sendo escrita mas ok, a acompanhei para ver algo que durou algo como um minuto apenas. E voltamos para a minha esposa que estava fechando o pagamento no caixa.


E lá estava a outra cliente, ainda. Mas com um rosto diferente. Um misto de desespero, agonia e arrependimento. Pois a surpresa chegou.


No meio do procedimento de aceite da oferta, a atendente teria pedido, "do nada", de forma simplória, que pudesse tirar uma foto do rosto da cliente, "só para completar o cadastro". Uma fotinho, apenas. Pois o procedimento incluia o uso de biometria.


Pow!!!!


Lá se foi um dos principais bens, dos principais dados de uma pessoa que, agora, por R$ 70, foi disponibilizado ao sistema sabemos lá de quem. No sistema da loja? Talvez. Mas e se o mecanismo for validado ou até criado por uma empresa terceira não claramente mencionada no processo, que pagou pelo cadastro em sua base da biometria em valor equivalente ao desconto concedido? Dentre tantas outras tantas possibilidades.


Meu queixo caiu.


Assim como do seu marido, que chegou naquele instante à caixa e perguntou o motivo da surpresa da esposa que então relatou ter permitido cadastrar seu rosto no meio de um processo de gozo de um desconto, o que lhe deixou na dúvida mas que aceitou, com desconforto, por não saber como lidar com a situação.


O marido disse, com razão - no meu ponto de vista pois é um dado muito sensível, ainda mais em tempos de AI mal aplicada e deepfakes -, que sua esposa deveria ter declinado o desconto. E a esposa ficou muito constrangida.


A balconista insistiu que naquele dia ela havia cadastrado o rosto de outros 10 clientes "sem problema algum" e que a empresa à qual ela trabalha não faria nada com os dados da cliente. Mas a compra estava feita, sem possibilidade de reversão de captação do seu rosto. E, cá entre nós, capturar dados para não usar, só faz quem gosta de gastar - e empresário inteligente não vê valor em gastar e sim em investir. Ou seja, o rosto seria usado m algum momento sabe-se lá para o quê.


E a cliente saiu com 10% de desconto, podendo pagar a compra no dia que escolheu, de onde estiver. E terá 10% de desconto na próxima compra. Mas ela também saiu com sua moral baixa, se sentindo mal, enganada e humilhada.

E o KPI diz que a cliente foi convertida.


Se você quiser saber se a cliente voltará à loja ou não, ou se, mesmo voltando, verá a marca de uma outra forma, me mande uma foto sua para que eu lhe envio a resposta Ü (PS: contém ironia, não me mande nada por favor!).


Sobre o autor: Christian Abramson, founder e diretor executivo da cübik consulting, empresa com serviços de consultoria, CMO as a service, palestras e advisorship para empresas e executivos de pequenas, médias e grandes corporações. Mais de 27 anos de experiência nas áreas de marketing, insights / inteligência de mercado e trade marketing, tanto de multinacionais quanto de startups.

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